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A história científica por trás da hormoniofobia: whi

Por mais de 50 anos, milhões de mulheres usaram terapia hormonal para tratar os sintomas climatéricos. O primeiro medicamento lançado no mercado canadense e americano em 1942 foi o Premarin (estrogênios conjugados equinos) e, àquela época, vários estudos mostravam que a reposição hormonal reduzia risco de doença cardiovascular (infarto, AVC), demência e osteoporose. A terapia hormonal era usada como tratamento e prevenção.

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Na década de 1990, o famoso estudo WHI (Women’s Health Initiative) foi lançado nos EUA, patrocinado pelo NIH. Um dos objetivos era avaliar, através de um ensaio clínico randomizado controlado, os efeitos da reposição hormonal sobre risco de doença cardiovascular, com câncer de mama como desfecho adverso primário, além de fraturas osteoporóticas, embolia pulmonar, câncer de endométrio e colorretal, além de mortalidade por outras causas em mulheres na pós menopausa. O trial envolveu mais de 15.000 mulheres e custou mais de 1 bilhão de dólares.

O WHI deveria ser finalizado em 2005, mas foi parado em 2002 devido à detecção de risco aumentado de câncer de mama no grupo que recebeu Premarin + Provera. Observaram também aumento do risco de infarto, AVCi (“derrame isquêmico”) e trombose neste grupo. Porém, esses riscos não foram vistos no grupo que só recebeu Premarin, sem Provera (terapia estrogênica isolada).

Àquela época, muitas mulheres usavam hormônios para aliviar os sintomas do climatério (ondas de calor, secura vaginal) e ficaram muito assustadas com os resultados publicados. Os médicos, em sua maioria ginecologistas, pararam de prescrever hormônios às suas pacientes. E o que aconteceu depois? Tudo o que o sábio Prof. Leon Speroff, autor do principal livro de Ginecologia Endócrina, já tinha escrito àquele mesmo ano: o WHI impactaria muito a prática clinica nos próximos anos e as mulheres que tinham indicação e se beneficiariam da terapia hormonal não a fariam por medo e perderiam a oportunidade de terem uma saúde melhor.

A geração de mulheres e médicos que viveu a publicação do WHI no JAMA (revista científica famosa e de grande impacto na Medicina) ficaram com a grande mensagem, ratificada pela mídia à época: Reposição Hormonal aumenta risco de câncer de mama. Vale a pena entender um pouco mais o WHI para saber que o que eles fizeram no estudo não é o que fazemos hoje.

Detalhes dos pacientes e métodos do whi:

hormoniofobia fumante

  • 16.608 mulheres com 50 a 79 anos, sendo que 45% tinham mais que 60 anos e 21% mais que 70 anos (atenção a este dado)
  • Média de idade: 63 anos
  • 35% tinham sobrepeso, 34% eram obesas
  • 10,5% fumavam, 40% eram ex-tabagistas
  • 36% eram hipertensas
  • Hormônios usados: Premarin 0,625 mg/d (estrogênios equinos conjugados) +

Provera 2,5 mg/d (acetato de medroxiprogesterona) versus Placebo, via oral se analisarmos o perfil das mulheres que entraram no estudo, vemos que não é exatamente o perfil das pacientes que tratamos na clínica. Inúmeros estudos derivados do WHI foram publicados nos anos seguintes, mostrando menor risco de infarto, AVC, Alzheimer, câncer colorretal e mortalidade geral quando a reposição era iniciada até 10 anos após menopausa.

O conceito da janela de oportunidade nascia, mostrando que, se bem-feita e no momento adequado, a terapia hormonal é um tratamento excelente e muito seguro.

Há anos, preconizamos que a reposição hormonal seja feita com hormônios isomoleculares (ex: 17-beta-estradiol), por vias seguras (ex: transdérmica ou subcutânea), em doses personalizadas e iniciada na janela de oportunidade.

Essas são premissas básicas para uma boa terapia hormonal, o que foi provado cientificamente nos últimos 18 anos, com estudos mais modernos que o WHI. Aqui, não vale uma crítica ferrenha ao WHI. Era o melhor que poderiam fazer àquela época, em que o Premarin e Provera eram as opções mais disponíveis e usadas no mundo todo. É importante entender o contexto do começo do século XXI para saber decifrar os resultados deste estudo que marcou uma geração de pacientes e médicos.

Obrigado pela leitura. 
Dr. Renato Tomioka